Poemetos

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sábado, 4 de dezembro de 2010

Quem sou eu?

QUEM SOU EU?



Eu sou eu e mais que eu, o que me cerca. Por isso eu sou a soma de tantos outros eus que me fizeram ser o que sou. Por isso, não caibo em uma definição, não sou passível de conceituação. Por isso, quando me apresento, comigo carrego um elenco de outros que me constituem. Eu sou eu e Machado, vivendo da vida a dúvida de Casmurro, e bandeira a bordejar estrelas de uma vida inteira. Eu sou o tempo de Agostinho, a história de Hegel, o ser de Sartre. eu sou o livro que eu li me leu e o que eu lerei da vida em mim. Eu sou eu e Kierkegaard, e Shopenhauer e Aristóteles. Tenho em mim parcelas de Tomás de Aquino, de Alexandre e Napoleão. Carrego Paulo e João (apocalíptico) em meu essere. e sou, mais que tudo, Afonso de Ligório e sua música, e seus escritos e seus projetos e seus sonhos. e pela música me conservo Mozart, Beethoven, Wagner, Bach e na evolução da escala me mantenho Renato Teixeira, Almir Sater, Sérgio reis. Ora pois isso confirma que não sou egoísta e me recorto recortando os outros e em mim colando as partes que me interessam. Destarte eu sou colagem e não me pretendo original. A minha essência é ser passível de influência, é ser capaz de assimilar o outro e por isso sou Luhman, e Kelsen, e Baleeiro... Sou também os que me cercam e mesmo os que de mim se afastam. Eu sou eu, caleidoscópio de milhares de faces, multifragmentado, labirinto de idéias e de sonhos. Em meu ser se digladiam o Apóstolo e o Apóstata. Há João dizendo do Verbo e Nietzsche cantando réquiens a Deus; Padre Júlio Maria pregando o deus Desprezado e o ateu desprezando a Deus. Há de tudo em mim, comigo convivendo e por mim vivendo. Por isso, fragmento de história que se faz eu não existo sem os outros; eu me desfaço me construindo e só creio que estarei em perfeita definição após deixar de ser.
Minto... Até depois de morto eu não serei eu mas soma de multi-eus. Pois que ao descer ao túmulo meus ossos serão unidos aos ossos dos que me antecederam, o sangue que nos une na última morada, a esperança que vivemos enfim confrontada. eu serei eu e meus avós e meus tios e meus bisavós e os antes deles. Lá ainda os fragmentos jamais serão descobertos porque unidos pelos fios da eternidade. Ainda lá serei sempre o gosto da saudade, o alimento do meu eu. Não a saudade do que passou, que isso não é saudade, mas a saudade do futuro e da eternidade. eu só sou eu se me abasteço das riquezas dos outros eus, eu só sou eu no olhar do outro e, antropofagicamente, deglutir o outro fazendo-me eu com eles. e por isso insisto em ser metamorfose constante; e por isso me permito não caber em definição alguma; e por isso serei eternamente incognoscível porque mutante, porque em eterno movimento. E sendo assim, serei eu e os que vieram antes de mim, eterno plágio. e sendo desse jeito serei eu e os que me cercam, constante paródia. E sendo eu serei os outros que me sucedem, imutável retorno. Eu sou eu e as circunstâncias que me rodeiam, e os olhos que me olham e os sonhos que sonho e as histórias que vivo. Eu sou soma, não divisão, multiplicação de feições, não subtração. E sou história de minha história e lenda de minhas ficções. Eu sou eu, eterna, infinita, majestosa contradição.

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